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Jun 5, 2010

... Anorexia e Bulimia : tratamento (in)voluntário? -I

O texto que abaixo transcrevo pode ser polémico, mas levanta uma questão (comparando dois tipos de doenças mentais) a meu ver muito importante: deve deixar-se exclusivamente à vontade do doente (com Anorexia Nervosa) a decisão de se tratar? Esta questão é ainda mais importante quando o doente é maior de idade. Qual a responsabilidade da sociedade? Levanta questões delicadas de liberdade individual. Lembrando um dito popular português "O doente não tem querer". A minha opinião é que em cada caso deveria ser vista a situação e benefícios de 'tratamento forçado'. Num artigo de Maio de 2009 publicado no International Journal of Eating Disorders IJED), Lopez, Yager, e Feinstein no artigo Medical Futility and Psychiatry: Palliative Care and Hospice Care as a Last Resort in the Treatment of Refractory Anorexia Nervosa, IJED, Volume 43 Issue 4, p. 372 - 377 , descrevem o caso de uma doente com anorexia que depois de muitos anos de doença faleceu. Na opinião de Sarah Ravin, psicóloga norte americana, que possui um blogue (aqui) o caso relatado nesse artigo discute como os serviços de saúde nos Estados Unidos os profissionais , a sociedade e as famílias ainda lidam de forma inadequada com a doença. O texto original em inglês pode ser lido aqui. Segue uma tradução parcial:

"O que há de errado com este caso? [ o caso relatado no artigo acima] A morte prematura de um jovem é sempre uma tragédia. Mas quando um jovem morre de uma doença tratável, é ainda pior. [...] Imagine, agora, que em vez de Anorexia Nervosa (AN) a doente sofria de Atraso Mental grave (AM) . A um paciente com a AM, não seria permitido envolver-se em comportamentos auto-agressivos. Se o doente não conseguisse comer sózinho, a família , uma enfermeira ou alguém que dele cuidasse iria preparar as refeições e alimentá-la à colher. Se o doente se envolvesse em em actividades físicas repetitivas que colocassem em perigo a sua saúde, o doente seria impedido para sua segurança. Se a família não fosse capaz de cuidar de um doente com AM, seria colocado num centro de tratamento ou similar. O custo desses serviços, mesmo nos Estados Unidos, seria subsidiado pelo governo. Permitir que uma pessoa com AM passasse fome seria considerado cruel e desumano. Mas para uma pessoa com Anorexia Nervosa (AN) já estaria bem?
Em certa medida é irónico pois ambas as doenças [Atraso Mental Grave (AM) e Anorexia nervosa (AN)] são doenças mentais de base biológica que resultam numa incapacidade para satisfazer as necessidades básicas do corpo. AM é, por definição, uma doença para toda a vida, incurável, que provoca efeitos muito negativos no comportamento.

A Anorexia Nervosa (AN) é no entanto tratável, e muitas pessoas ficam completamente curadas. Ao contrário da maioria das pessoas com AM, as pessoas com AN são pessoas com uma capacidade para formar relacionamentos íntimos, alcançar níveis académicos elevados, ter carreiras de relevo, independentemente da função, e dar enormes contibutos para a sociedade.
A sociedade tem contribuido muito para a melhoria do bem estar dos doentes com AM. Temos a ética médica, orientações jurídicas e programas de governo para proteger esses doentes e garantir que suas necessidades sejam satisfeitas. (...) são oferecidos apoios durante o tempo que precisam, em geral durante toda a vida. Mas para alguém com AN o tratamento pode terminar quando o seguro (de saúde) acaba, ou quando os pais ou a equipa de tratamento ficam fartos. Ou quando um juiz decide que o tratamento ainda não deve ser iniciado.

Note-se, não nos estamos a referir às pessoas com AN como sendo "mais interessante" do que pessoas com AM e, portanto, "mais merecedores" de recursos. Muito pelo contrário. Acreditamos que todos os seres humanos, independentemente da doença física ou mental, deficiência, raça, sexo, religião ou orientação sexual, merecem a preços acessíveis, serviços de saúde eficazes ao longo da sua vida. Porque é que temos falhado no tratamento de pessoas com AN mas temos cuidado bem de pessoas com AM? Porque a maioria das pessoas na sociedade, e muitas na minha própria profissão [psicóloga], acreditam que a anorexia nervosa é uma escolha.
Ninguém, nem mesmo uma criança, acredita que as pessoas escolhem um Atraso Mental. Então, porque é que muitos profissionais acreditam que o tratamento dos pacientes com Anorexia nervosa devem ser motivados para se recuperar, iniciar o tratamento de boa vontade, e gerir os seus sintomas por conta própria? Ninguém espera em relação a pessoas com AM tornarem-se motivadas a recuperar, o que fazem é fornecer-lhes os serviços, e ninguém espera que eles (os doentes com Atraso Mental) façam a gestão dos seus problemas sozinhos. Porque é que o nosso sistema legal [ Estados Unidos] considera que um adulto com um IMC de 10, que corre 15 milhas por dia e não pode alimentar-se é competente para tomar as suas decisões de saúde? Convenhamos...podemos fazer muito melhor do que isso. " Sarah Ravin (psicóloga)

3 comments:

Anonymous said...

Sem dizer ao psiquiatra (especializado em dca) ou mesmo dizendo o contrário, baralhando-o, a Anorexia deixava-me alguns momento de lucidez, totalmente vividos em silêncio. Um IMC de 12,9, vomitos constantes, jejuns, muito exercício... A lucidez de que falo era esta frase que me ficava na cabeça: "dr interne-me, obrigue-me a ir, não me dê escolha porque eu não posso escolher tratar-me dessa maneira"
Nunca disse a frase, mas ainda hoje ela cá está...e nunca a vou conseguir dizer, e talvez por isso nunca me cure.
Porquê? Porque não iria pela minha "vontade", mas nao iria contrariada...estranho? sim, mas é demasiado pesado pedir a alguém que quase morreu de magreza para decidir alimentar-se e aumentar o peso... Quantas de nós não se querem curar, mas cá dentro há um "eu quero curar-me mas não quero aumentar o peso" embora saibamos, racionalmente, que não há uma coisa sem a outra...
Não sei o que me vai acontecer...mas há dias emque só quero que o corpo me assuste, me internem, e me deixem lá ficar até ser capaz de tomar conta de mim...

um testemunho sincero,
t

Dark AM said...

Fui ao blog da psicóloga e li sobre o assunto. Há uma coisa que é uma grande verdade e que custa muito para quem está doente ou já foi doente: atirar-nos à cara que nós é que escolhemos ter a doença. Não pensam, se fosse uma escolha não era considerado uma doença.
O que custa é quando são os próprios pais a dizer isso.

Força e parabéns pelo bom trabalho

Anonymous said...

Quantas de nós não se querem curar, mas cá dentro há um "eu quero curar-me mas não quero aumentar o peso"

esta frase estava no comentário anterior. identifico-me muito com isso.
eu quero vencer isto... quero ser saudavel.
eu não sei o que fazer... não sei o que comer. quero ser normal.
Quantas de nós não se querem curar, mas cá dentro há um "eu quero curar-me mas não quero aumentar o peso"

esta frase estava no comentério anterior. identifico-me muito com isso.
eu quero vencer isto... quero ser saudavel.
eu não sei o que fazer... não sei o que comer. quero ser normal.
adiciona-me se puderes falar comigo.
beijos
R.