Abaixo transcrevo parte de uma entrevista dada à revista Activa à Jornalista Cristina Correia em 27 de Outubro de 2009. Toda a entrevista pode ser lida aqui
Foto flickr cc, título my life (aqui)
José Delgado, 48 anos, viu definhar de dia para dia o corpo e o sorriso da filha mais nova, Sofia. Ainda hoje, com a quase completa recuperação, não sabe dizer o que levou a menina de então 11 anos (hoje tem 18) a olhar para o seu corpo magro ao espelho e a dizer que o odiava, a esconder comida, a recusar refeições, a bater no estômago vazio para ver se ele abatia ainda mais, a pensar em suicídio.
O alerta soou depois da família ver uma reportagem sobre anorexia nervosa, onde reconheceu alguns dos sintomas da filha. (...)
Apesar de muita gente lhe chamar 'mania', a anorexia nervosa é um distúrbio alimentar que pode levar à morte. Estima-se que as taxas de mortalidade da doença se situem entre os 10% e os 15%; o suicídio ronda os 2,5%, segundo dados da Associação de Familiares e Amigos de Anorécticos e Bulímicos (AFAAB). 'A minha filha chegou a dizer-me que se suicidava. Isso mexe muito com um pai. Nessas alturas, dizia-lhe que, se isso acontecesse, iríamos ficar muito mal, mas que quem tinha mais a perder era ela.' Na pior fase da doença, a jovem ficou acamada em casa, em regime ambulatório, durante três meses. (...)
(...)
José Delgado acrescentar-lhe-ia outros traços: quase todos os anorécticos são excelentes alunos e demonstram uma maturidade precoce. 'A minha filha não teve adolescência; passou da pré-adolescência à idade adulta. E hoje está numa fase em que os colegas da idade dela são putos que não cresceram.'
(...)
Na sua luta de sete anos, José Delgado aprendeu muita coisa. 'É preciso estarmos muito atentos aos momentos em que eles querem falar connosco, porque são poucos e são muito subtis a demonstrá-lo. Aprendi que a educação que demos aos nossos filhos não tem nada que ver com a doença há muitos pais que se culpabilizam que os nossos filhos precisam de segurança e firmeza; que, num distúrbio alimentar como este, a comida não é o essencial. Como diz Daniel Sampaio, a comida já está na mesa, não é preciso falar sobre ela. Aprendi a desligar a televisão à hora das refeições. Quantas vezes a minha família esteve toda à mesa e a Sofia não comeu o que estava estipulado, mas existiu diálogo.' Para um anoréctico, esta é a hora de todas as angústias. Sentir-se pressionado a comer só piora tudo.
(...)
Em algumas fases da doença mentem muito.' Mas há sinais ainda mais subtis. 'Os irmãos mais novos e os animais de estimação engordam de repente. (...)
(...)
Foi por pensar que a partilha da sua experiência poderia ajudar na cura dos filhos que José Delgado se envolveu na associação AFAAB. 'São mais as pessoas que nos telefonam com dúvidas do que aquelas que participam nas reuniões de pais. Ainda há muita vergonha e medo de falar sobre a doença. Há quem não saia de casa porque tem vergonha dos filhos ou porque não querem perguntas de vizinhos e família. Só fecham mais o ciclo de isolamento da família. Alguns pais adoecem com depressões. Há casos de rupturas familiares quando as pessoas não aguentaram a carga.'
(...)
'A maior parte das doentes fica curada ou têm uma vida normal, apesar de manterem traços da doença.' O primeiro passo no tratamento é também o mais difícil de dar, diz o médico Abel Matos Silva. 'Antes de tudo, é preciso que a doente admita ter um problema.
(...)
Normalmente, é a família que a leva ao médico, dado que a própria se recusa a aceitar a gravidade da situação. O tratamento pode incluir psicoterapia individual, de grupo e familiar, aconselhamento nutricional e medicação e, nos casos mais graves, o internamento um índice de massa corporal inferior a 15 já o sugere.'
José Delgado, 48 anos, viu definhar de dia para dia o corpo e o sorriso da filha mais nova, Sofia. Ainda hoje, com a quase completa recuperação, não sabe dizer o que levou a menina de então 11 anos (hoje tem 18) a olhar para o seu corpo magro ao espelho e a dizer que o odiava, a esconder comida, a recusar refeições, a bater no estômago vazio para ver se ele abatia ainda mais, a pensar em suicídio.
O alerta soou depois da família ver uma reportagem sobre anorexia nervosa, onde reconheceu alguns dos sintomas da filha. (...)
Apesar de muita gente lhe chamar 'mania', a anorexia nervosa é um distúrbio alimentar que pode levar à morte. Estima-se que as taxas de mortalidade da doença se situem entre os 10% e os 15%; o suicídio ronda os 2,5%, segundo dados da Associação de Familiares e Amigos de Anorécticos e Bulímicos (AFAAB). 'A minha filha chegou a dizer-me que se suicidava. Isso mexe muito com um pai. Nessas alturas, dizia-lhe que, se isso acontecesse, iríamos ficar muito mal, mas que quem tinha mais a perder era ela.' Na pior fase da doença, a jovem ficou acamada em casa, em regime ambulatório, durante três meses. (...)
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José Delgado acrescentar-lhe-ia outros traços: quase todos os anorécticos são excelentes alunos e demonstram uma maturidade precoce. 'A minha filha não teve adolescência; passou da pré-adolescência à idade adulta. E hoje está numa fase em que os colegas da idade dela são putos que não cresceram.'
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Na sua luta de sete anos, José Delgado aprendeu muita coisa. 'É preciso estarmos muito atentos aos momentos em que eles querem falar connosco, porque são poucos e são muito subtis a demonstrá-lo. Aprendi que a educação que demos aos nossos filhos não tem nada que ver com a doença há muitos pais que se culpabilizam que os nossos filhos precisam de segurança e firmeza; que, num distúrbio alimentar como este, a comida não é o essencial. Como diz Daniel Sampaio, a comida já está na mesa, não é preciso falar sobre ela. Aprendi a desligar a televisão à hora das refeições. Quantas vezes a minha família esteve toda à mesa e a Sofia não comeu o que estava estipulado, mas existiu diálogo.' Para um anoréctico, esta é a hora de todas as angústias. Sentir-se pressionado a comer só piora tudo.
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Em algumas fases da doença mentem muito.' Mas há sinais ainda mais subtis. 'Os irmãos mais novos e os animais de estimação engordam de repente. (...)
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Foi por pensar que a partilha da sua experiência poderia ajudar na cura dos filhos que José Delgado se envolveu na associação AFAAB. 'São mais as pessoas que nos telefonam com dúvidas do que aquelas que participam nas reuniões de pais. Ainda há muita vergonha e medo de falar sobre a doença. Há quem não saia de casa porque tem vergonha dos filhos ou porque não querem perguntas de vizinhos e família. Só fecham mais o ciclo de isolamento da família. Alguns pais adoecem com depressões. Há casos de rupturas familiares quando as pessoas não aguentaram a carga.'
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'A maior parte das doentes fica curada ou têm uma vida normal, apesar de manterem traços da doença.' O primeiro passo no tratamento é também o mais difícil de dar, diz o médico Abel Matos Silva. 'Antes de tudo, é preciso que a doente admita ter um problema.
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Normalmente, é a família que a leva ao médico, dado que a própria se recusa a aceitar a gravidade da situação. O tratamento pode incluir psicoterapia individual, de grupo e familiar, aconselhamento nutricional e medicação e, nos casos mais graves, o internamento um índice de massa corporal inferior a 15 já o sugere.'
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